Pesquisas comCUCA

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Para não saír da memoria


Após cerca de um ano e meio de luta e pressão do Fórum Permanente de ex-Presos e Perseguidos Políticos do Estado de São Paulo junto ao Governo do Estado, foi reinaugurado, no último 24 de janeiro, o Memorial da Resistência, antigo prédio do Departamento de Ordem Política e Social do Estado de São Paulo (Deops/SP).

Após reforma, o memorial reabre com uma nova concepção museológica para preservação da memória “de milhares de combatentes, que nunca aceitaram a opressão das classes dominantes e seus instrumentos ditatoriais”. De acordo com o jornalista Ivan Seixas, diretor do Fórum, “resgatar este velho prédio e transformá-lo num símbolo de resistência é a manifestação de quem luta pela democracia e não quer esconder nossa história. E nem apagar as pistas de sangue deixadas por carrascos impunes até os dias de hoje”.




Reconstituição das celas

Com a pressão realizada pelo Fórum, conseguiu-se a mudança do nome do Memorial e a realização de uma significativa reforma. Em agosto de 2007, foi apresentado o projeto de remodelamento, e sua implantação iniciou-se em agosto de 2008.




Na reforma foram reconstituídas celas, a fim de apresentar as reais condições a que os presos eram submetidos. Com ajuda de ex-presos, também foram refeitas inscrições nas paredes para resgatar as frases de resistência e solidariedade que haviam sido apagadas. Também foram instalados equipamentos audiovisuais por meio dos quais os visitantes podem informar-se sobre o que foi o espaço.




Na avaliação de Seixas, para cumprir seu papel histórico e didático, o Memorial deve ter um destino militante. “Projetos e programações devem sensibilizar a sociedade sobre a importância da luta pela Anistia, a Justiça de Transição e os Direitos Humanos para a Democracia. Para nós do Fórum dos ex-Presos e Perseguidos Políticos, o objetivo maior é completar a transição democrática, consolidar e aprofundar a democracia”, salientou.




Sem precedentes

Segundo Kátia Filipini, museóloga da Estação Pinacoteca do Estado “não temos conhecimento de nenhum outro projeto do tipo, no Brasil. O que sabemos é que há um museu na Argentina, ligado à Escola Superior de Mecânica da Armada (Esma), e que no Chile há um projeto em implantação”.




Sobre a importância do Memorial como instrumento de preservação e resgate da memória, ela afirma que “o museu é uma boa tentativa nessa luta e, como seu foco principal é a Ação Educativa e Cultural, desde já estão em projeto seminários, debates e palestras para contribuir nesse sentido”.




De acordo com o secretário da cultura, João Sayad, presente à solenidade de inauguração, a recaracterização do Memorial deveria ter sido ainda mais dramática, para retratar melhor o que foi aquele período. Para ele, o modo como as celas haviam sido apresentadas na última reforma, assemelhavam-se mais a salas confortáveis de um hotel. Estiveram presentes à solenidade de inauguração o governador do Estado de São Paulo, José Serra, e os secretários da Cultura, João Sayad, e da Justiça e Defesa da Cidadania, Luiz Antônio Marrey, o presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, que representou o ministro da Justiça, Tarso Genro; o diretor da Pinacoteca do Estado, Marcelo Araújo, e Rogério Sottili, representando o ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, além de Raphael Martinelli que, juntamente com Ivan Seixas falou em nome do Fórum Permanente de ex-Presos e Perseguidos Políticos do Estado de São Paulo.




Histórico

Localizado no Largo Manoel Osório, próximo à estação Luz da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), o prédio onde hoje funciona a Estação Pinacoteca, anexo da Pinacoteca do Estado, foi projetado em 1914 por Ramos de Azevedo, destinado a ser um armazém para a Ferrovia Sorocabana.




Porém, em 1949, durante o governo do General Eurico Gaspar Dutra, o Deops/SP, criado 25 anos antes com a finalidade de combater os movimentos sociais e outras manifestações originárias de “ideologias exóticas”, como o anarquismo e o sindicalismo, é transferido para o prédio do antigo armazém. Assim, passa a ser o cenário sombrio no qual se desenrolaram diversos atentados de lesa-humanidade, amplificados durante a ditadura civil-militar de 1964-1984.




Inaugurado em 2002 com o nome de Memorial da Liberdade, o atual Memorial da Resistência passou por inúmeros processos de transformação, o que acarretou a descaracterização do prédio. Foram destruídas duas celas, localizadas no térreo, e chamado “Fundão”, que era formado por antigas celas reforçadas, que funcionavam como solitárias. Além disso, o espaço recebeu pinturas modernas e sofisticadas, foram destruídos os banheiros que eram utilizados pelos presos e raspadas inscrições deixadas nas paredes das celas por presos políticos de diversas gerações.




As reformas e nome atribuído ao Memorial, então, desencadearam o descontentamento de grupos ligados às vítimas da violência durante a ditadura militar, de modo especial o Fórum Permanente de ex-Presos e Perseguidos Políticos do Estado de São Paulo.



por Jonathan Constantino,

de São Paulo (SP)
, Da agencia de noticias www.brasildefato.com.br