Estátua viva, em cima de um banco de praça no Calçadão da Cardoso, pés negros descalços, ele empunha dois pedaços de papel envoltos plásticos rígido transparente como uma espécie de resumo de suas estranhas pregações, precariamente escritas a lápis tinta. Moisés maltrapilho e orgulhoso de sua loucura, não desprega o olho de seu único bem, uma bolsa de pano cinza, descolorida pelo sol e quase toda remendada. Desconhece ser hoje 10 de setembro, dia tenso, véspera de coisa ruim para muitos, depois do fim das duas torres norte-americanas.
Paro e, em sua frente, abro minha pequena pasta. De lá, retiro duas folhas de papel jornal para copiar os mandamentos do profeta andarilho que pousou como uma ave na sedentária bancada dos frequentadores do Calçadão. Apoio os papéis em cima da minha agenda e ao sacar a caneta bic já me vejo cercado por alguns velhinhos curiosos que perguntam o que vou fazer com aquelas anotações. Deve ser pra jornal, pensou alto um deles.